Nana Caymmi e a voz que atravessou o tempo
Filha de Dorival Caymmi, Nana construiu uma trajetória singular na música brasileira.
Por LockDJ
Publicado em 02/05/2025 01:08 • Atualizado 02/05/2025 01:09
Música
Nana Caymmi deixa um legado que escapa às listas e números (Foto: Reprodução)

Nana Caymmi partiu nesta quinta-feira, dia 1º de maio de 2025. Sua ausência fecha um ciclo na história da música brasileira, mas seu canto permanece. Não como memória congelada, mas como uma presença viva, de timbre inconfundível e interpretação marcada por pausa, densidade e silêncio.

 

Filha de Dorival Caymmi e Stella Maris, Nana nasceu em uma casa onde música era gesto cotidiano. Carregou o nome da família e o expandiu para além da herança. Enquanto o pai construiu paisagens sonoras a partir do mar, da rede e da fala lenta da Bahia, Nana seguiu por um caminho próprio: o da contenção, da canção sustentada no tempo longo da voz e no intervalo entre os versos.

 

Iniciou a carreira em 1960, ainda sob o peso da comparação familiar. Passou pelos festivais da canção, encontrou resistências e distâncias, até firmar um repertório construído com rigor. Gravou 27 discos, entre eles álbuns dedicados a Tito Madi, Tom Jobim e Vinicius de Moraes. Escolhia o que cantar como quem constrói uma arquitetura: nota a nota, verso a verso, sem pressa.

 

Sua leitura de “Resposta ao Tempo”, canção de Cristóvão Bastos e Aldir Blanc, tornou-se referência. Não por ornamentação, mas pela escuta. A canção se dissolve no ar como se fosse ditada por alguém que já entendeu o peso das horas. O mesmo acontece com “Cais” (Milton Nascimento e Ronaldo Bastos), “Não se Esqueça de Mim” (Roberto Carlos e Erasmo Carlos) e “Ponta de Areia”, onde Nana não interpreta — apenas diz, e esse dizer basta.

 

Nana não se impunha ao repertório. Ela se retirava o suficiente para que a canção emergisse. Sua arte não se prestava ao espetáculo. Preferia o canto que permanece mesmo quando a música termina. Sua voz sustentava pausas. E, talvez por isso, continue a ecoar agora que ela já não está.

 

Nana Caymmi deixa um legado que escapa às listas e números. Sua obra é continuidade de um pensamento musical que atravessa gerações, não por carregar um nome, mas por construir um gesto.

 

O silêncio após sua morte carrega aquilo que sua música sempre soube habitar: o espaço entre uma nota e outra. E ali, ela ainda canta.

 

 

#NanaCaymmi

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