Entre o desconforto e o colapso: The Bends completa 30 anos
Segundo álbum da banda britânica Radiohead é um desconforto como obra de arte.
Por LockDJ
Publicado em 21/05/2025 09:46
Música
The Bends completou 30 anos com a beleza de não se encaixar (Foto: Reprodução)

Há 30 anos, Radiohead entregava The Bends ao mundo. Três décadas depois, o disco segue como um artefato estranho no tempo — nem exatamente o Radiohead do colapso digital de OK Computer, nem a banda que ainda flertava com o grunge engessado de Pablo Honey. The Bends é, talvez, o ponto onde o desconforto começou a ganhar forma concreta. Um disco de transição, sim, mas não no sentido simplista. É transição como colisão.

 

O álbum surge quando a indústria ainda vendia guitarras como resposta ao vazio. No entanto, as guitarras de The Bends não oferecem resposta alguma. Elas apenas amplificam o ruído interno. Há algo na distorção de My Iron Lung que não soa só musical, mas quase uma metáfora para o próprio mecanismo da indústria que o Radiohead começava a enfrentar — e rejeitar.

 

Enquanto o britpop consolidava seus hinos ensolarados, The Bends caminhava na direção oposta. Fake Plastic Trees não é uma balada, é uma confissão constrangedora. Uma música sobre o cansaço de tudo que se vende como real e nunca é. Aquilo que parecia romântico na superfície, na verdade, é só sintoma de uma sociedade empacotada, plastificada, prestes a se sufocar nas próprias fachadas.

 

 

Em Just, a banda oferece um riff quase debochado, construindo tensão enquanto Thom Yorke dispara uma sequência de acusações sem nunca explicar exatamente contra quem. É sobre quem? Sobre você. Sobre mim. Sobre ninguém. Sobre todos.

Há uma espécie de agonia sutil em todo o disco. Black Star, por exemplo, poderia ser um lamento qualquer sobre relações quebradas, mas o Radiohead arrasta o tema para uma dimensão maior, quase sociológica. Nada está bem. E não vai ficar. Não é só sobre amor. É sobre ser.

 

High and Dry é, paradoxalmente, uma das músicas mais populares e menos queridas pelo próprio Radiohead. Escrita originalmente como uma balada meio acidental, a faixa escapa do cinismo ácido do restante de The Bends e escancara uma vulnerabilidade desconfortável. Fala sobre abandono, sobre ser deixado à deriva — "Don't leave me high, don't leave me dry" —, mas não apenas no sentido afetivo. É o retrato de alguém esmagado entre a expectativa e o fracasso, entre o desejo de ser visto e o medo de desaparecer. Uma canção que nunca foi feita para ser hit, mas virou. E talvez por isso incomode tanto.

 

 

E então vem Street Spirit (Fade Out) — faixa de encerramento e talvez uma das declarações mais brutais de impotência dos anos 90. Tudo fade out. Tudo apaga. Tudo some. A música não oferece clímax, nem redenção. Apenas constatação.

 

30 anos depois, The Bends permanece sendo esse disco que não quer ser confortável, não quer ser hino, não quer ser catarse. Ele quer, talvez, apenas deixar claro que a sufocação já estava ali, muito antes dos algoritmos, muito antes do colapso do real. O grito que não cabe na garganta, transformado em acordes dissonantes e letras que nunca fecham sentido por completo.

 

O que fazer com isso? Talvez exatamente o que The Bends propõe: nada. Apenas ouvir. E aceitar que nem toda resposta vem embalada.

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