Existe um dia no calendário em que o rock parece conspirar com o tempo; 27 de maio. Uma data que carrega estreias, despedidas e marcos capazes de atravessar décadas e costurar diferentes gerações, gêneros e estéticas sonoras.
Foi em 27 de maio de 1965 que os Rolling Stones lançaram nos Estados Unidos o compacto com "(I Can’t Get No) Satisfaction", aquele riff de guitarra que não apenas mudou a história da banda, mas praticamente desenhou os contornos do que se reconhece como rock de estádio, sexualidade, provocação e inconformismo até hoje.
Dois anos depois, em 1967, John Lennon anunciava ao mundo que os Beatles não subiriam mais aos palcos. Era o fim dos shows ao vivo para um grupo que decidiu, a partir dali, que a verdadeira revolução seria feita dentro dos estúdios, rompendo com qualquer expectativa de performance e criando uma nova linguagem para o rock — mais conceitual, mais introspectiva, mais livre.
No mesmo eixo de ruptura e provocação, em 1977, os Sex Pistols lançaram o compacto com "God Save The Queen", uma afronta direta à monarquia britânica em pleno jubileu da rainha. Uma faixa que não apenas foi censurada, mas transformada em manifesto — um soco na cara do establishment, no conservadorismo e em qualquer ideia de que a música deveria servir à ordem.
Enquanto o punk explodia nas ruas de Londres, no outro lado do Atlântico, o rock ganhava novas camadas. Em 1975, Paul McCartney soltava nos EUA o álbum "Venus And Mars", um trabalho que consolidava os Wings como projeto pós-Beatles, reafirmando sua capacidade de habitar o mainstream, sem se repetir.
E mais de duas décadas depois, em 1997, ele provaria de novo, com "Flaming Pie", que sua assinatura melódica é atemporal, capaz de atravessar gerações sem perder frescor.
Se há uma marca nesse 27 de maio, é a diversidade dos caminhos. Em 2003, o Led Zeppelin abria seus arquivos e lançava o poderoso "How the West Was Won", um documento sonoro que captura o Zeppelin ao vivo no auge — não como uma celebração nostálgica, mas como prova de que aquele tipo de energia nunca mais seria replicado.
No Brasil, o mesmo 27 de maio guarda seus próprios marcos. Em 1999, os Raimundos lançaram "Só no Forévis", um disco que elevou o grupo ao seu ponto mais alto, misturando hardcore, forró, irreverência e agressividade — uma síntese perfeita da cara torta e debochada do rock brasileiro dos anos 90.
E se a data é feita de marcos, também é feita de chegadas e partidas. Em 1961, nasceu Renato Rocha, o "Negrete", integrante da formação clássica da Legião Urbana, que ajudou a construir uma das discografias mais definitivas do rock nacional.
Após muitos problemas com drogas e álcool, e ter chegado, inclusive, a morar na rua, Rocha foi encontrado morto por uma amiga num quarto de hotel, em 22 de fevereiro de 2015. O ex-baixista foi vítima de uma parada cardíaca.
E em 2024, o rock brasileiro perdeu Gustavo Mullem, guitarrista da formação original do Camisa de Vênus, banda que ajudou a inaugurar, nos anos 80, uma linhagem de rock sujo, direto e sem concessões.
Já em 2017, o mundo se despedia de Gregg Allman, fundador da Allman Brothers Band, mestre dos improvisos, dos blues infinitos e da fusão do rock com a alma do sul dos Estados Unidos.
E entre todos esses pontos no mapa da história, talvez um dos mais simbólicos seja o lançamento, em 1962, de "The Freewheelin’ Bob Dylan". Um álbum que não apenas redefiniu o folk, mas abriu caminho para que o rock ganhasse outra função: ser discurso, poesia, manifesto, ferramenta de transformação.
Se o rock é uma linha do tempo torta, cheia de desvios, confrontos, rupturas e reinvenções, o 27 de maio parece ser aquele ponto onde todos esses caminhos se cruzam. Um lembrete de que a música, mais do que trilha, é território — de conflito, de expressão, de resistência e, claro, de celebração.