Lançado há exatos 36 anos, no dia 15 de junho de 1989, Bleach não é um disco de chegada, mas de presságio. O Nirvana ainda não era fenômeno — era apenas uma banda do subúrbio de Aberdeen, gravando um álbum com orçamento emprestado e distorções por todos os lados. Mas ali já havia mais do que o eco de um grunge em gestação: havia o retrato sujo de uma juventude encurralada, sem horizonte, articulada em gritos abafados e riffs repetidos até sangrar.
Gravado em apenas 30 horas no estúdio Reciprocal, em Seattle, com produção de Jack Endino e financiado com cerca de 600 dólares por Jason Everman (que aparece na capa, embora não tenha tocado uma única nota), o álbum se ancora numa urgência que é quase física. Dave Grohl ainda não havia chegado — é Chad Channing quem assume a bateria. Mas o que pulsa em Bleach não é coesão, e sim tensão.
Kurt Cobain, Krist Novoselic e os ruídos que orbitam entre eles constroem faixas que parecem saídas de um porão úmido, com canções como "Negative Creep", "Floyd the Barber" "School" e "About a Girl", entregando linhas secas e pesadas, sem a intenção de soar agradáveis. O grunge aqui ainda é híbrido: carrega o peso do sludge, a estética lo-fi do punk hardcore e o descompromisso formal que viria a ser classificado, mais tarde, como “som de Seattle”.
Bleach não possui refrões para cantar em coro. É o som de um corpo estranho tentando se mover dentro de um sistema que já apodreceu. Cobain, em sua fase mais introspectiva e nihilista, ainda escreve letras com estruturas desarticuladas, como quem está mais interessado na textura da palavra do que no seu significado. A distorção é a mensagem. A afinação baixa é o efeito colateral.
Quando a Sub Pop lançou o disco, poucos notaram. A explosão só viria dois anos depois, com Nevermind, e isso transformou Bleach num artefato arqueológico. Mas hoje, 36 anos depois, o que se ouve ali ainda é matéria viva. Não por ser profético, mas por ser direto — sem maquiagem, sem explicações, sem simulações de grandeza.
O Nirvana ainda não era o mito. Mas Bleach já era um corte. Uma cicatriz inaugural. Um ponto sem retorno.