35 anos do álbum que ironizou a fé e entronizou o pop no rock nacional
O Papa é Pop segue como um dos registros mais ambíguos e provocativos do rock brasileiro.
Por LockDJ
Publicado em 22/06/2025 06:00
Música
Humberto Gessinger, Augusto Licks e Carlos Maltz formam o núcleo base dos Engenheiros (Foto: Divulgação)

Lançado no ano de 1990, O Papa é Pop, dos Engenheiros do Hawaii, completa 35 anos em 2025 — e segue como um dos registros mais ambíguos e provocativos do rock brasileiro. Muito além do hit radiofônico que dá nome ao disco, o álbum funciona como um espelho distorcido do Brasil pós-década de 80: cético, saturado de ídolos e mergulhado num pop rock de guitarras bem polidas e letras filosóficas travestidas de slogans.

 

Gravado já com a formação consolidada do trio Humberto Gessinger, Augusto Licks e Carlos Maltz, o álbum é quase uma síntese da transição do grupo entre o rock universitário das calças vermelhas e o existencialismo à brasileira que viria em Várias Variáveis (1991). Aqui, a banda escancara o flerte com o pop sem abrir mão de sua verborragia característica. O paradoxo está no título: o papa é pop — mas o pop também é dogma, e isso incomoda.

 

O disco se equilibra entre faixas radiofônicas e ensaios lírico-políticos. “Era um Garoto que Como Eu Amava os Beatles e os Rolling Stones”, regravação da versão de Os Incríveis, é um respiro nostálgico em meio ao cinismo de faixas como “Pra Ser Sincero” e “Olhos Iguais aos Seus”, ambas com melodias que embalam confissões disfarçadas de aforismos. Gessinger canta como quem escreve num caderno de sociologia marginal — o som é pop, mas as ideias mastigam a contracultura dos anos 80 com uma colher de ironia.

 

 

Em “O Papa é Pop”, faixa-título, o trio parece prever o culto à celebridade que ganharia o mainstream nos anos seguintes, e funciona como um alerta pré-Google, pré-Big Brother, pré-streaming. É o embrião do século XXI cantado em fita cassete.

 

 

Trinta e cinco anos depois, o disco ainda provoca quem o ouve com atenção. Não é o mais virtuoso dos Engenheiros, nem o mais cru. Mas talvez seja o mais perigoso: um álbum que popifica o sagrado, e sagra o pop como instrumento de questionamento — justo numa época em que a música parecia buscar salvação mais do que revolução.

 

O Papa é Pop segue como uma missa alternativa, celebrada ao som de guitarras, dúvidas e palavras em excesso. E, por isso mesmo, ainda ecoa como um dos álbuns mais estranhamente necessários da música brasileira dos anos 90.

 

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