Na manhã do dia 22 de julho, calou-se uma das vozes mais inquietas da história do rock. John Michael Osbourne, conhecido pelo mundo como Ozzy, deixou o palco final. Não houve explosões, morcegos ou manchetes sensacionalistas — apenas o silêncio íntimo de uma despedida cercada de amor, conforme comunicado da família. Um adeus que atravessa décadas de ruído elétrico, palcos suados, vozes roucas e espelhos estilhaçados da cultura popular.
Ozzy não foi apenas um cantor, tampouco só um símbolo de excessos. Foi o som do desequilíbrio tornado linguagem. A alma aflita do pós-industrialismo inglês que, nos subúrbios cinzentos de Birmingham, encontrou no Black Sabbath não uma banda, mas uma brecha de expressão. Com riffs que não pediam licença e letras que enfrentavam os espectros da guerra, da religião, da loucura e da carne, Ozzy cantou — e berrou — sobre aquilo que muitos preferiam calar.
Sua despedida dos palcos, em 5 de julho, foi uma espécie de rito pagão e coletivo. Birmingham, sua terra natal, viu o Sabbath erguer pela última vez um muro de som, enquanto o mundo assistia em streaming, não a um espetáculo, mas a um ritual. A última transfiguração pública do “príncipe das trevas”, que carregava nos ombros não títulos, mas cicatrizes.
Ozzy atravessou o metal, a mídia, as clínicas de reabilitação e a cultura pop como um sobrevivente que nunca pediu redenção. Fez da fragilidade sua couraça e, mesmo com a voz falha, manteve-se em cena até que o corpo dissesse basta. A doença de Parkinson, que o acompanhava nos últimos anos, não o calou. Apenas afinou, aos poucos, sua presença no mundo.
Hoje, com sua partida, não se encerra uma carreira, mas se arqueia um ciclo que moldou a paisagem sonora de gerações. Ozzy não foi o herói nem o vilão, mas o espelho torto onde a humanidade viu refletidos seus abismos interiores ao som de guitarras em lamento contínuo.
Em seu lugar, no tempo e no palco, fica o eco de um timbre inconfundível, as sombras de um palco agora vazio e a memória de um homem que não buscava glória, mas intensidade. A indústria perde um ícone. O rock, um corpo estranho que se tornou coração. E o mundo, um grito que não saberá mais de onde virá.
Descanse, Ozzy. Não em paz, mas em reverberação.