No dia 31 de julho de 1954, há exatos 71 anos, a bandeira da Itália tremulou pela primeira vez no topo do K2, a segunda montanha mais alta do mundo, com 8.611 metros. A conquista pelos alpinistas Achille Compagnoni e Lino Lacedelli foi celebrada como um feito histórico. Mas por trás da glória oficial, uma sombra pairou por décadas: o “caso K2”, talvez a mais polêmica narrativa de exclusão, manipulação e sobrevivência extrema do montanhismo moderno.
A versão heroica que percorreu os jornais omitia o que de fato ocorrera naquela noite gelada entre os dias 30 e 31 de julho. Dois alpinistas, Walter Bonatti — jovem promessa da escalada italiana — e Amir Mahdi, um carregador da etnia hunza, enfrentaram a zona da morte sem abrigo, equipamento ou alimento, após encontrarem deslocada a barraca que lhes serviria de proteção. Carregavam os cilindros de oxigênio essenciais para o sucesso da escalada, mas foram deliberadamente deixados à própria sorte pelos colegas. Bonatti sobreviveu ao bivaque forçado; Mahdi, não — perdeu todos os dedos dos pés por congelamento.
Ao voltar da montanha, Bonatti não foi celebrado, mas silenciado. Acusado injustamente de usar o oxigênio reservado aos cumeadores, tornou-se vítima de uma campanha difamatória conduzida por Compagnoni e pelo líder da expedição, o geólogo Ardito Desio. A verdade só viria meio século depois, com a revisão oficial dos fatos pelo Clube Alpino Italiano e o testemunho tardio de Lacedelli, que em seu livro K2: Il prezzo della conquista reconheceu o papel essencial — e o sacrifício — de Bonatti e Mahdi. A montanha foi conquistada, mas o preço cobrado foi mais do que físico: foi humano, simbólico, ético.
A história tensa e áspera do K2 segue viva também no cinema. O filme K2 – A Montanha da Morte (1991), disponível AQUI, dramatiza o desafio técnico e psicológico que a escalada impõe.

Embora baseado em outra narrativa de ficção inspirada em expedições reais, o longa capta o espírito bruto do K2: clima imprevisível, paredes quase verticais e uma taxa de letalidade superior à do Everest.
Documentários como The Summit (2012), que retrata a tragédia de 2008, quando 11 montanhistas morreram quase simultaneamente, aprofundam a sensação de que o K2 não é apenas uma montanha — é um espelho cruel da ambição humana.
No K2, cada passo pode ser um epitáfio e cada conquista, uma dívida com os que ficaram pelo caminho.