Em 2 de setembro de 1965, os Beatles lançavam oficialmente Yesterday, faixa que se tornaria uma das músicas mais emblemáticas do século XX. Sessenta anos depois, ela permanece como uma das composições mais executadas e reinterpretadas da história: são mais de 1.600 versões registradas e milhões de execuções em rádios pelo mundo, segundo o Guinness World Records e a BMI.
A canção carrega uma singularidade dentro do próprio repertório dos Beatles. Gravada apenas por Paul McCartney, acompanhado por um quarteto de cordas, rompeu com o padrão da banda até então baseada no formato guitarra-baixo-bateria. Sua estrutura enxuta, com pouco mais de dois minutos, inaugurava também um novo caminho para a música pop: a balada intimista que falava de perda e memória em contraste com a energia juvenil que havia marcado a fase inicial do grupo. Não à toa, os demais integrantes resistiram em lançá-la como single no Reino Unido, receosos de que destoasse da imagem coletiva.
A origem de Yesterday já nasceu envolta em mito. McCartney relatou ter sonhado com a melodia inteira na casa de Jane Asher, em Londres. Ao acordar, correu ao piano para registrá-la, convencido por semanas de que poderia ter plagiado algo inconscientemente.
Perguntou a amigos e músicos se conheciam a melodia, até concluir que, de fato, era inédita. O título provisório, Scrambled Eggs, virou anedota, mas evidencia o caráter quase fortuito de uma criação que atravessaria gerações.
Sessenta anos mais tarde, Yesterday tornou-se documento cultural. Sobreviveu à explosão da Beatlemania, ao fim da banda, às mutações do pop e ao tempo. Sua permanência em catálogos de streaming e em incontáveis reinterpretações — de Ray Charles a Frank Sinatra, de versões em bossa nova a orquestrais — mostra que a simplicidade da melodia e a universalidade da letra seguem capazes de dialogar com diferentes épocas e públicos.
O que Yesterday revela, sobretudo, é a capacidade da música de se projetar além de seu contexto imediato. Criada no coração dos anos 1960, permanece atual porque fala de perda e memória de forma despojada, quase desarmada. Ao completar seis décadas, a canção confirma que, no cânone dos Beatles e na história da cultura popular, há peças que não pertencem apenas ao seu tempo, mas ao imaginário coletivo que insiste em revisitá-las.