Os discos gêmeos Use Your Illusion I e II fazem 34 anos nesta quarta-feira (17 de setembro de 1991–2025) e ainda soam como um cometa entrando na cidade: barulhento, teatral, desmedido. O mundo do lançamento era outro; a Guerra Fria se apagava, o CD virava fetiche doméstico, a MTV ditava o relógio, e, uma semana depois, Nevermind dobraria a esquina. Entre o glam tardio e a maré grunge, o Guns N’ Roses escolheu um gesto à antiga: dois álbuns no mesmo dia, marketing de blockbuster (Terminator 2 no topo das bilheterias, “You Could Be Mine” na trilha) e uma turnê que parecia não terminar. Resultado: estreia simultânea no topo das paradas (com o II acima do I nos EUA) e um recado à indústria: rock também sabe pensar grande.
Se o I concentra o romance gótico e os refrões de vitrine, o Use Your Illusion II é a ala de debates: “Civil War” abre o disco como editorial, citação de Cool Hand Luke, groove de trincheira, guitarra que protesta mais do que posa. “14 Years” traz Izzy na linha de frente, com uma melancolia de boteco que só o Guns conseguiria amplificar em estádio.
“Yesterdays” é confissão madura (Axl em modo memória), enquanto “Locomotive” espicha o funk-metal com malícia de estúdio. Há o cover colossal de “Knockin’ On Heaven’s Door” (rebatizado à época pela grandiloquência da banda) e a epifania oceânica de “Estranged”, em que arranjos orquestrais e guitarras líquidas reinventam a balada hard como cinema. E, no fim, o glitch “My World”, um minuto e meio industrial que antecipa uma paranoia 90s: o rock flertando com a máquina.
Curiosidades que viraram mitologia? “You Could Be Mine” foi o cavalo de Troia perfeito: single lançado antes, videoclipe com Schwarzenegger, sinergia de estúdio e bilheteria — o Guns entendia o sistema por dentro e o devolvia maior, mais caro, mais brilhante. “Get in the Ring” (no I) nomeava jornalistas e cutucava a mídia. O rock ainda mordia.
Os videoclipes-épico (o tríptico com “Don’t Cry”/“November Rain”/“Estranged”) elevaram o custo das produções a patamares de Hollywood e ajudaram a consolidar uma economia MTV feita de superproduções. As lojas abriam à meia-noite, as pilhas de CDs formavam muradas, e o SoundScan inaugurava a era dos números em tempo real: uma banda de rua operando como estúdio maior que a vida.
Trinta e quatro anos depois, o II permanece como a parte menos “óbvia” e mais cult do díptico: é onde o Guns usa a musculatura para arranjar, expandir, alongar, sem medo de parecer excessivo. A graça está justamente aí: no excesso como linguagem. Voltar a “Civil War” numa timeline crispada, cruzar “Yesterdays” com as suas versões de si mesmo, entrar em “Estranged” como quem mergulha de madrugada. Tudo confirma que esse disco duplo “quebrou” a indústria não só pelo tamanho, mas por provar que, sim, o hard rock podia ser barroco, ambicioso e, ainda assim, de rua. E quando os metais de “Knockin’…” abrirem caminho, você lembrará: o Guns de 1991 não pedia licença, ele redesenhava a moldura.