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“Equilíbrio Distante” uniu Rio, Roma e um coração em trânsito
Segundo álbum solo de Renato Russo completa 30 anos em 2025, entre memórias, melancolia e a coragem de cantar.
Por LockDJ
Publicado em 19/10/2025 06:00
Música
“Equilíbrio Distante” deixa o legado cosmopolita do artista que se reescreveu pela voz (Foto: Divulgação)

Em 2025, completam-se 30 anos do lançamento de Equilíbrio Distante, o segundo álbum solo de Renato Russo — e o último em vida —, marcado por singularidade artística e uma íntima imersão nas raízes e na lírica da Itália.


Entre a busca pessoal e a experimentação musical

Renato estava atravessando um período conturbado, lidando com depressão e grandes inquietações pessoais. O projeto nasceu como algo quase intuitivo: ele adquiriu diversos CDs italianos ao acaso, reconhecendo no estilo vocal italiano algo próximo à sua própria voz e à forma como se relacionava com a canção. O resultado: um disco de regravações de canções italianas, inteiramente em italiano, numa empreitada que dialoga com herança, identidade e versão pessoal de um artista brasileiro. 

Estrutura e duração

Gravado ao longo de cerca de nove meses, já desacompanhado da formação principal da Legião Urbana, Equilíbrio Distante marca uma virada.

A fluidez vocal, a escolha do repertório (como “Strani Amori”, “La Forza della Vita”, entre outras) e a ambientação sonora revelam um lado menos explícito de Renato Russo. Não o “rockiroda” imediato da Legião, mas um intérprete que se lança num universo distinto, mediterrâneo e introspectivo.


O som e a estética


Musicalmente, o disco propõe arranjos contidos, elegantes, com clima de “canção de alma” mais do que de grito de protesto. Mistura-se aí a herança pós-rock, a pop italiana, a melancolia brasileira. Conforme observadores da obra, Renato fez desse álbum “uma postura ativa” sobre o amor: não de resignação, mas de decisão, mudança, ruptura com o que não se sustenta. 

Visualmente, a arte gráfica acompanha a proposta. Os desenhos do filho de Renato, Giuliano, retratando o Pão de Açúcar, o Coliseu, a Torre de Pisa, o Maracanã, aludem ao gesto de unir Brasil e Itália, passado e presente, identidade híbrida. 


Temas em evidência


O álbum aborda, ainda que por meio de repertório alheio (italiano), intensamente temas como a solidão, o amor que se transforma, a perda, o indivíduo em confronto com o mundo. Em “Strani Amori”, por exemplo, há o desejo de não mais “sofrer”, de assumir que é preciso mudar. Em “La Forza della Vita”, o contexto de vulnerabilidade humana emerge, algo que ecoa na situação pessoal de Renato naquele momento.


Impacto e recepção


Logo após o lançamento, o álbum vendeu cerca de 200 mil cópias, atestand à força do artista mesmo em trajeto solo. A recepção, contudo, não foi unânime, houve críticas. Por exemplo, segundo a Folha de S. Paulo, o disco “não consegue repetir o lirismo delicado” de seu antecessor. Ainda assim, o álbum ocupa hoje lugar de destaque na discografia nacional, sobretudo pelo risco artístico e pela profundidade de quem se expôs em outro idioma, outra cultura, outro modo de interpretar a canção.

Por que importa hoje — aos 30 anos


– Ele serve como ponte entre o Brasil e a Itália, evidenciando uma globalização cultural de forma íntima.

– Mostra Renato Russo em transição. Não mais apenas o vocalista da Legião, mas o artista solo que confronta medos, raízes e linguagem.

– Prova que a música popular brasileira pode incorporar recortes internacionais, sem perder verniz autoral. Aliás, ganhando em densidade.

– Para o ouvinte atual, o álbum oferece uma paisagem sonora de contemplação, refinamento e autenticidade. Momento fora da velocidade habitual, convidando à escuta atenta.


Ponto de equilíbrio


O disco Equilíbrio Distante é ao mesmo tempo um gesto de saudade, de raízes, de país, de tempo, e de avanço. O artista se lança, muda a língua, muda o contexto, muda a forma. A “distância” do título talvez se refira aos lugares, à língua, ao tempo, e o “equilíbrio”, à forma que Renato encontra para se equilibrar entre mundos.


Celebrar seus 30 anos é cultuar uma obra que ousou, que tocou fragilidades e fortalezas, e que permanece singular no cânone da música brasileira.

“A canção italiana é parecida com a minha voz… e as letras tratavam de temas parecidos com os da Legião”, disse Renato Russo em entrevista, certo de que cantava exatamente aquilo que acreditava.


Equilíbrio reserva janelas para outro tempo, e, curiosamente, para o agora. 

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