Jean-Louis Lebris de Kerouac, franco-canadense de origem, se transformou no arquétipo do poeta que viveu na ponta da linha, entre o trampo e a rima, entre o ônibus que não parava e o digitar frenético de versos. Seu legado não se resumiu à literatura, ele simbolizou o espírito de contracultura, a busca pelo instante verdadeiro e o abandono das convenções.
Mais de duas décadas depois, a banda 10 000 Maniacs surgiria para ir além dos beats e tecer uma ponte sonora entre aquele “beat” de Kerouac e o “beat” pop-alternativo dos anos 80 e 90. Em suas canções, pense em “Because the Night” (cover) ou “These Are the Days”, pulsa uma leve melancolia habitual à estrada, ao tempo que passa e nunca retorna.
A conexão é sutil, mas potente. Kerouac falava de estrada, agora digo estrada, agora vou; os 10 000 Maniacs falam de memória, vão embora-sendo-ainda e guardam o rastro. É como se a banda cortasse o silêncio deixado por Kerouac e o tornasse trilha sonora de fim de tarde urbano.
Kerouac morreu, mas o viajante interno continuou correndo, agora nos acordes, nas guitarras cristalinas e nas vozes suaves que ainda perguntam: “onde foi o tempo que passou?”
A leitura cult da cena é esta: Kerouac nos deixou um mapa de “ser livre” e os 10 000 Maniacs nos lembram que a liberdade também transcorre em “lembrar que fomos, que somos e que podemos”. Há quase uma liturgia nisso: Jack, a caligrafia das estradas, a banda, a trilha de uma estrada interna. E quando acionamos as músicas, reacendemos o vagar dele, percebemos que, de fato, o poeta beatnik jamais deu adeus.