Depois de anos de expectativa – e de um orçamento que circula a casa dos US$ 300 milhões, financiado pela Apple Studios em parceria com a Fórmula 1 – F1 enfim cruza a linha de chegada. O longa de Joseph Kosinski (Top Gun: Maverick) mira alto: transformar a adrenalina de um Grande Prêmio em narrativa dramática, algo que o cinema raramente conseguiu sem recorrer a clichês ou simplificações. O resultado não é perfeito, mas entrega a experiência mais imersiva já filmada sobre a categoria.
Motor em alta rotação
Kosinski capitaliza a tecnologia desenvolvida ao longo de dois anos de filmagens nos paddocks reais da F1: câmeras adaptadas a carros-teste, áudio binaural dos motores e uso pontual de LED volumes para recriar trechos de pistas fechadas. A abertura, que coloca o espectador dentro do cockpit do protagonista Sonny Hayes (Brad Pitt) na curva Eau Rouge, estabelece o tom: som de turbocompressor cortando o silêncio, telemetria projetada no painel e vibração estrutural traduzida em micro-oscilação de lente. O salto imersivo faz as sequências de Rush (2013) – até então a referência moderna – parecerem videogame.
Damson Idris, como o promissor Joshua Pearce, é o contrapeso narrativo: juventude, talento bruto e certa arrogância moldada pela era das redes sociais.
A química entre Idris e Pitt funciona porque não força o arquétipo mentor-e-discípulo; há competitividade real, quase desconfortável, que desemboca em um terceiro ato sem concessões sentimentais.
Freios e contrapesos
Se o aspecto visual é impecável, o roteiro (Ehren Kruger e o próprio Kosinski) derrapa em curvas conhecidas: a equipe modesta com última chance, o magnata (Javier Bardem se divertindo em modo “chefe larger-than-life”) dividindo vilania com a mídia sensacionalista, e a revelação de trauma que motiva Hayes a voltar às pistas. Nada disso estraga a corrida, mas faz o filme perder torque dramático quando abandona o asfalto para resolver pendências emocionais em diálogos explicativos.
Ainda assim, Kerry Condon – engenheira de pista durona, inspirada em nomes como Ruth Buscombe – injeta pragmatismo e humor seco, equilibrando as cenas de bastidor. Sua interação com Hayes durante um pit stop tenso é puro subtexto: dois profissionais se entendendo por códigos, enquanto o público segura a respiração com o cronômetro na tela.
Veredicto
F1 vale o ingresso no Imax – preferência absoluta – pela captura inédita de velocidade e a fotografia de Claudio Miranda, que combina GoPros de altíssima taxa de quadros com variações de grão analógico em câmera lenta. O filme prova que, quando a tecnologia serve à linguagem e não o inverso, o espetáculo ganha peso físico.
Fica a sensação de que Kosinski poderia ter arriscado ainda mais na desconstrução do mito do “loner driver”. Mesmo assim, o longa acelera além dos limites de gênero e estabelece novo padrão para esportes a motor no cinema. O espectador sai da sala com os tímpanos ainda vibrando – e com a certeza de ter testemunhado algo que só a tela grande (e alguns milhões de dólares) podem proporcionar.
Pontos altos
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Imersão audiovisual sem precedentes em filmes de corrida.
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Química Brad Pitt / Damson Idris; Kerry Condon rouba cenas.
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Uso inventivo de tecnologia in-camera, evitando excesso de CGI.
Pontos baixos
Nota final: 8/10 – acelerando forte, mesmo com algumas curvas narrativas previsíveis.