Há séries que não se contentam em entreter, elas escavam. Task, produção original da HBO, é um desses exemplos. Ao longo de sete episódios intensos, o criador Brad Ingelsby (o mesmo de Mare of Easttown) conduz o espectador por uma Filadélfia desencantada, onde cada personagem parece carregar o peso de uma culpa antiga. O último episódio, exibido neste domingo (19), encerra uma trajetória que vai muito além de um drama policial. É uma meditação sobre fé, remorso e a busca por redenção em meio ao colapso moral de uma comunidade.
No centro da trama está Tom Brandis, interpretado com vigor contido por Mark Ruffalo, um ex-policial e ex-padre que retorna à sua cidade natal após anos de afastamento. Ele se envolve em uma investigação de sequestro que o obriga a encarar seus próprios fantasmas, ao mesmo tempo em que tenta reconstruir vínculos familiares despedaçados.
O enredo policial, embora bem estruturado, funciona mais como espelho das falhas humanas do que como motor de suspense. Cada episódio revela mais sobre o passado ferido de Brandis do que sobre o caso em si, e é justamente aí que Task encontra sua força: na lentidão com que as verdades se deixam ver.
A direção aposta em uma estética fria e realista, com ruas úmidas, casas de tijolos gastos, bares sombrios, luz amarelada de lâmpadas antigas. Essa atmosfera opressiva faz de Task quase uma experiência sensorial. O ritmo é propositalmente lento, mas o peso emocional nunca cede. Há uma humanidade dolorida em cada gesto, em cada silêncio. E quando a série se aproxima do fim, percebemos que o verdadeiro mistério não é o crime, mas o limite do perdão, o que se pode remendar e o que se perde para sempre.
O que funciona
Elenco afiado: Mark Ruffalo entrega uma das atuações mais sólidas de sua carreira, equilibrando fragilidade e brutalidade. Tom Pelphrey (de Ozark) complementa com intensidade emocional e olhar ferido. A química entre ambos sustenta toda a série.

Tom Pelphrey entrega um personagem muito intenso (Foto: Divulgação)
Roteiro introspectivo: Brad Ingelsby volta a abordar temas caros à sua obra — culpa, fé, fracasso e reconciliação. A narrativa é menos sobre “quem fez” e mais sobre “por que fazemos”.
Fotografia e ambientação: A direção de fotografia traduz visualmente a decadência moral do ambiente. É uma Filadélfia cinzenta, quase fantasmagórica, que ecoa os conflitos internos dos personagens.
Trilha sonora discreta: As escolhas musicais evitam o melodrama e reforçam o tom melancólico. Silêncio, respiração e ruídos urbanos dizem mais do que palavras.
O que pode incomodar
A carga de melancolia pode pesar. Task é implacavelmente sombria, sem humor e com narrativa por vezes aérea. Para espectadores que preferem um ritmo mais leve ou alguma fuga no entretenimento, pode parecer excessiva.
Em certos episódios, o mistério central perde um pouco de força, o que pode gerar sensação de familiaridade ou de repetição no subgênero de dramas policiais ambientados em comunidades degradadas.
A estrutura de “sete episódios” dá sensação de série limitada (o que ela é), mas a narrativa deixa alguns elementos em aberto, o que pode frustrar quem busca fechamento total. No entanto, nada que comprometa a solidez da produção.
Veredito
Task é uma série densa, dolorosa e com roteiro maduro. Não busca chocar pelo crime, mas tocar pelo humano. É sobre o peso de viver com o que não se pode desfazer e como, às vezes, o perdão é mais difícil que a culpa.
A HBO reafirma aqui sua vocação para dramas realistas e complexos, entregando uma obra que permanece na memória, muito depois do último episódio.
Nota: ★★★★☆ 9,0/10 — Um drama pesado, de ritmo deliberadamente lento e emoção contida, que exige entrega do espectador, mas recompensa com uma das narrativas mais maduras do ano.