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O Clube da Esquina amanheceu em silêncio
Lô Borges transformou melodias em paisagem e deu forma sonora ao sonho coletivo de uma geração.
Por LockDJ
Publicado em 03/11/2025 10:18 • Atualizado 03/11/2025 10:20
Música
Mais do que canções, Lô Borges deixou uma linguagem (Foto: Divulgação)

O Clube da Esquina amanheceu vazio. Lô Borges, aquele menino de Santa Tereza que um dia se sentou nas escadas do Edifício Levy para ouvir Milton Nascimento tocar violão, partiu nesta segunda-feira (3), aos 73 anos.


O músico mineiro, internado desde 17 de outubro por uma intoxicação medicamentosa, morreu em Belo Horizonte, deixando uma das obras mais delicadas e luminosas da música brasileira.


A esquina onde nasceu o infinito

Nos anos 1960, entre as ruas Divinópolis e Paraisópolis, um grupo de jovens mineiros começou a reinventar a canção popular brasileira. Lô, Milton, Beto Guedes, Tavinho Moura, Toninho Horta, todos orbitando entre guitarras, harmonias ousadas e poesia existencial. Dali nasceu o Clube da Esquina, movimento que uniu mineiridade, rock, jazz e fé poética.

Em 1972, o álbum “Clube da Esquina”, assinado por Lô e Milton, redefiniu os contornos da MPB. Meio século depois, continua a soar moderno, entre coros, cordas e o cheiro de chuva de Belo Horizonte. No mesmo ano, o jovem compositor lançou seu mítico “Disco do Tênis”, espécie de diário adolescente de alma psicodélica e sonhadora, hoje reverenciado por artistas do indie ao tropicalismo tardio.


O artista que trocou o palco pela travessia

Lô Borges nunca teve pressa. Depois do sucesso, preferiu o silêncio de Arembepe, na Bahia, onde continuou compondo. Voltou mais maduro com “Via Láctea” (1978), um disco sobre o tempo e a lucidez. Anos depois, fez de “Sonho Real” (1984) sua volta às turnês nacionais e, nos anos 1990, reaproximou-se do grande público com “Dois Rios”, parceria com Samuel Rosa.

Nos últimos anos, mantinha uma produção fértil: lançava álbuns anuais, entre eles o recente “Céu de Giz” (2025), gravado com Zeca Baleiro. Um gesto final de parceria e reinvenção.


O som que não se cala

Mais do que canções, Lô Borges deixou uma linguagem. Seu violão dissonante, suas harmonias transparentes e suas letras de aurora e infância moldaram uma estética onde o pop se encontra com a transcendência.


Se o Clube da Esquina é uma constelação, Lô era uma de suas estrelas centrais. O menino que sonhava acordado nas esquinas de Belo Horizonte e acabou mudando o curso da música brasileira.

Hoje, o silêncio que fica não é o da ausência, mas o da reverência. Porque, enquanto houver alguém cantarolando “Um girassol da cor do seu cabelo”, o Clube da Esquina continuará vivo, mesmo que a esquina pareça vazia.

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