Discreto nos cinemas e recém-chegado ao digital, A Vida de Chuck é o filme em que Mike Flanagan mostra que sua assinatura vai além do medo. Em três capítulos que se encaixam como lembranças, a adaptação do conto de Stephen King acompanha o “homem qualquer” Chuck (Tom Hiddleston) pela beleza do amor, o peso do luto e os lampejos de sentido que raramente cabem num final feliz, e, ainda assim, comovem.
O filme (sem spoilers)
Flanagan estrutura a narrativa como um quebra-cabeça emocional. Primeiro, vemos um mundo reagindo a anúncios que “agradecem” Chuck. Depois, um recorte íntimo de sua vida adulta. Por fim, a infância com os avós. A unidade não está na cronologia, mas no efeito de reverberação. Cada peça ilumina a anterior, até que o todo se revela como um estudo sobre impermanência.
Direção e tom
Conhecido pela carpintaria de sustos elegantes, Flanagan aqui aposta em melancolia luminosa. A câmera é suave, os silêncios falam, e uma longa sequência de dança, conduzida com segurança de quem poderia dirigir um musical, vira o coração do filme.
Há ecos de cinema de aventura afetiva à la Spielberg/Donner, mas filtrados por um olhar adulto, interessado no que permanece quando o espetáculo termina.
Elenco
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Tom Hiddleston tem menos tempo de tela do que se imagina, mas imprime calor e carisma no segundo ato.
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Mark Hamill (Albie) é o grande destaque: entrega uma interpretação de rigidez ferida, oscilando entre dureza, trauma e ternura. O segmento mais “assombrado” do longa repousa nele.
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O conjunto ainda conta com Chiwetel Ejiofor, Karen Gillan, Matthew Lillard, Jacob Tremblay e Benjamin Pajak, afinados num registro contido.
Temas
O filme fala de tempo, memória e legado. Ao invés de perguntar “o que nos assombra?”, questiona “o que deixamos nos outros?”. O gesto de agradecer a Chuck é a moldura simbólica de uma obra que aposta no afeto como arquitetura dramática.
Deslizes
A opção por capítulos dá respiro poético, mas cobra ritmo. A primeira parte, de tintas sci-fi, pode afastar quem espera um eixo narrativo tradicional. Há também momentos de subtexto explicado demais, quando a imagem já dizia o suficiente.
Veredito
Flanagan prova que sua força não depende de corredores escuros. A Vida de Chuck é um filme de pequenos milagres; discretos, íntimos e, por isso mesmo, duradouros. Finaliza com a sensação de ter sido lembrado do essencial.
Nota: ★★★★☆ (4 de 5)
Onde assistir
Disponível na loja do Prime Video: