Lançada pela AMC, “Kevin Can Fk Himself”** é uma das produções mais criativas e subversivas dos últimos anos. Estrelada por Annie Murphy (a Alexis de Schitt’s Creek), a série parte de uma ideia engenhosa: o que acontece quando a esposa perfeita das comédias de situação, sempre sorridente e relegada ao fundo do palco, decide parar de sorrir?
A estrutura visual da série é o golpe de mestre. Quando Kevin, o marido idiota típico da sitcom, está em cena, tudo ganha o formato clássico de uma comédia: iluminação quente, trilha alegre, risadas de plateia. Mas quando ele sai do enquadramento, o mundo de Allison (Murphy) se torna frio, silencioso e realista. Uma fotografia quase noir que revela a opressão escondida sob o riso enlatado. É um comentário visual impactante sobre como a cultura pop mascarou a misoginia com humor por décadas.
A performance de Annie Murphy é o coração da série. Ela alterna com precisão entre a passividade esperada e a fúria contida de quem percebe que sua vida foi escrita como piada. O texto é ácido, por vezes incômodo, e mistura gêneros, como sátira, drama doméstico, thriller, para desmontar a ilusão de um “final feliz” feminino. A segunda temporada amarra bem a proposta: Allison não quer apenas fugir de Kevin, quer desligar de vez o riso que a aprisiona.
⭐⭐⭐⭐ Nota VB: 9/10 — Ousada, inteligente e ferina. Uma demolição do riso masculino travestido de amor. Disponível na Prime Vídeo.