Assistimos: "Sereias" e o poder que se esconde no afeto
Com um elenco enxuto e atmosfera sufocante, a série avança menos pela ação e mais pela tensão acumulada nos diálogos e nos silêncios.
Por LockDJ
Publicado em 30/06/2025 06:00
Entretenimento
"Sereias" é estrelada por Julinne Moore, Meghann Fahy e Milly Alcock (Foto: Divulgação)

Ambientada em uma mansão isolada à beira-mar durante um único fim de semana, Sereias (Sirens), criada por Molly Smith Metzler e baseada na peça Elemeno Pea, se constrói como uma observação dramatizada sobre o controle invisível que se exerce por meio do afeto, da lealdade e da hierarquia social. Com um elenco enxuto e atmosfera sufocante, a série avança menos pela ação e mais pela tensão acumulada nos diálogos e nos silêncios.

 

A trama gira em torno de Devon (Meghann Fahy), uma mulher prática e crítica, que visita a irmã Simone (Milly Alcock) na propriedade de sua nova chefe, Michaela Kell — uma bilionária com hábitos ritualísticos e um discurso progressista enviesado. O final de semana, a princípio festivo, logo ganha contornos de manipulação psicológica, e a tentativa de resgatar Simone se inverte num jogo de poder que atravessa questões de classe, gênero e afeto. A série lida com esses temas sem transformá-los em tese, confiando na construção gradativa do incômodo.

 

Julianne Moore, como Michaela, compõe a figura de uma matriarca enigmática que age menos pelo que diz e mais pelo que representa — um tipo de dominação amável, mas estrutural. Sua presença serve de catalisador para os conflitos das duas irmãs e impõe um ritmo ambíguo à narrativa. Ao lado dela, Kevin Bacon interpreta o marido da bilionária com uma atuação discreta e irônica, funcionando como um contraponto que tensiona ainda mais a instabilidade do cenário. Sua participação não ocupa o centro da história, mas funciona como elemento de ruído — algo fora do lugar que faz o tabuleiro estremecer.

 

                                           Kevin Bacon e Julianne Moore em cena de "Sereias" (Foto: Divulgação)

 

A série evita soluções fáceis. Não há clímax clássico, mas sim uma lenta erosão das certezas das personagens. A câmera insiste nos espaços fechados da casa, explorando o enclausuramento não apenas físico, mas emocional. As relações entre as personagens deslizam entre o afeto real e a manipulação simbólica — e é nesse intervalo que Sereias constrói seu campo de força.

 

A estrutura de episódios curtos e concentrados favorece a imersão, ainda que a narrativa exija paciência. As mudanças de tom — entre o humor seco e o drama psicológico — são sutis, e o desconforto se impõe mais pela sugestão do que pelo confronto direto. O resultado é uma minissérie que observa com precisão a forma como o poder se insinua nos laços mais íntimos.

 

⭐⭐⭐ Nota: 8/10

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