O chocolate chegou à Europa no século 15 pelas mãos dos colonizadores espanhóis, após séculos sendo conhecido apenas por maias e astecas como bebida ritual e símbolo de prestígio. Com sua chegada ao Velho Mundo, ganhou o apelido de ouro negro, sendo incorporado ao cotidiano das cortes europeias como um produto de luxo e distinção.
O acesso era restrito à aristocracia. Apenas com a Revolução Industrial, o chocolate deixou de ser um privilégio da nobreza para se transformar em produto de massa — desejado, embalado, comercializado.
Esse mesmo produto, carregado de memórias coloniais, mercantis e culturais, se converteu em símbolo pop através de uma história que, ao longo do tempo, foi narrada em três formatos distintos: livro, musical e fábula visual.
Publicado em 1964, o livro Charlie and the Chocolate Factory, do britânico Roald Dahl, propõe uma alegoria fabril em que o chocolate se torna portal para uma espécie de teste moral. A narrativa segue um menino pobre, Charlie Bucket, que ganha um bilhete dourado para visitar a fábrica de doces comandada por Willy Wonka — figura excêntrica, industrial e oracular.
A primeira adaptação para o cinema veio em 1971, dirigida por Mel Stuart, com Gene Wilder (falecido em 2016) no papel de Wonka. O filme Willy Wonka & the Chocolate Factory foi moldado como musical. A estética e o ritmo da produção transformam a fábrica em um teatro de provações, em que as crianças visitantes falham sucessivamente diante dos excessos do consumo, da vaidade, da gula, da arrogância — temas que já estavam no livro, mas ganham densidade no corpo performático do filme.

Em 2005, a história retorna ao cinema com direção de Tim Burton e Johnny Depp interpretando Wonka. A adaptação é mais sombria e explora as origens psicológicas do personagem, inserindo flashbacks que não estavam no material original.
A fábrica, agora hipercolorida e mecanizada, reflete o paradoxo entre inovação e isolamento. Burton ressignifica a figura do industrial como alguém traumatizado pela rejeição, com uma fábrica que produz prazer mas opera sob rigidez e controle.

Ambas as versões falam sobre o mesmo produto — o chocolate — mas a forma como ele é tratado varia: se na versão de 1971 ele é símbolo de desejo e lição de moral, na de 2005 ele é também sintoma, refém da infância reprimida de seu criador.
No Dia Mundial do Chocolate, lembrar da Fantástica Fábrica de Chocolate é revisitar não apenas a sedução do doce, mas também o que ele carrega de promessa, escassez, fantasia e poder. O bilhete dourado, nesse contexto, é menos um prêmio e mais um convite à reflexão: o que fazemos com o que desejamos?
Ambas as versões do filme estão disponíveis na plataforma MAX