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43 anos do filme Pink Floyd – The Wall: um colapso emocional em câmera lenta
Trata-se de uma obra que se assiste com os olhos arregalados, os ouvidos dilatados e a alma em ruínas.
Por LockDJ
Publicado em 06/08/2025 06:00
Entretenimento
Visualmente, o filme é um espetáculo de angústia (Foto: Divulgação)

Lançado em 6 de agosto de 1982, o filme Pink Floyd – The Wall, dirigido por Alan Parker e com roteiro de Roger Waters, não é apenas uma adaptação audiovisual do disco homônimo lançado pela banda em 1979 — é a tradução cinematográfica de um colapso emocional em câmera lenta. Quarenta e três anos depois, a obra ainda pulsa como uma das experiências mais radicais e desconfortáveis do cruzamento entre música, trauma e política. É um filme que se assiste com os olhos arregalados, os ouvidos dilatados e a alma em ruínas.

 

A estrutura narrativa é fragmentada, quase onírica, e acompanha o personagem Pink, interpretado por Bob Geldof, vocalista do Boomtown Rats. Ele é um astro do rock emocionalmente devastado, isolado em um quarto de hotel enquanto sua psique implode sob o peso de lembranças traumáticas, desilusões amorosas, violência escolar, alienação social e o luto pelo pai morto na Segunda Guerra Mundial. Todos esses elementos se somam à metáfora central do filme: a construção de um "muro" psicológico como mecanismo de defesa, tijolo por tijolo, até que o próprio indivíduo se perca de si mesmo.

 

Visualmente, o filme é um espetáculo de angústia. Alan Parker, conhecido por obras como Expresso da Meia-Noite e Fama, imprime uma direção visceral, intercalando cenas reais com animações agressivas e simbólicas criadas por Gerald Scarfe. As imagens não servem como ilustração da música — elas extrapolam e expandem o significado. Soldados se metamorfoseando em martelos marchando em uníssono, crianças sendo moídas em uma máquina escolar, uma flor que se transforma em criatura fálica devoradora: tudo é alegoria e excesso. O resultado é uma linguagem própria, híbrida, entre videoclipe, teatro expressionista e pesadelo freudiano.

 

O disco The Wall, base de toda a narrativa, já era em si uma ópera-rock megalômana, com 26 faixas que vão do lamento existencial à crítica feroz à indústria da guerra, ao sistema educacional e à alienação cultural. No filme, essas faixas ganham uma potência dramática ampliada. Another Brick in the Wall, por exemplo, se torna mais do que uma crítica à escola autoritária: vira denúncia visual de um sistema que esmaga a criatividade e a identidade das crianças. Comfortably Numb, em seu trecho mais lírico e melancólico, é transformada em ritual anestésico, um momento de suspensão entre a dor e a loucura.

 

Roger Waters, cuja vida pessoal serve de espinha dorsal para a obra, concebe em The Wall seu testamento mais íntimo e caótico. A dor da perda do pai, a raiva contra o sistema, o medo da repetição dos erros — tudo é exposto de forma brutal e sem filtros. O filme também antecipa debates que só se tornariam centrais anos depois: saúde mental, masculinidade tóxica, celebridade como prisão e a instrumentalização da arte pela política.

 

Apesar de sua magnitude estética e conceitual, Pink Floyd – The Wall não é um filme fácil. Não há diálogos tradicionais, não há catarse clássica. É um mergulho para dentro de um cérebro em colapso, sem salva-vidas. Mas para quem está disposto a atravessar esse labirinto de dor e beleza, a experiência é insuperável.

 

Disponível atualmente apenas no YouTube com áudio original, The Wall sobrevive como obra de arte inquieta e incômoda. Quarenta e três anos depois, o muro continua de pé — não como barreira, mas como espelho. E o que vemos refletido nele ainda nos obriga a perguntar: que parte de nós mesmos estamos tentando esconder?

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